Vens tu do céu profundo ou sais do precipício
Beleza? Teu olhar divino, mas daninho,
Confusamente verte o bem e o malefício,
E pode-se por isso comparar-te ao vinho.
Em teu olhar refletes toda a luz diuturna;
Lanças perfumes como a noite tempestuosa;
Teus beijos são um filtro e tua boca uma urna
Que torna o herói covarde e a criança corajosa.
Provéns do negro abismo ou da esfera infinita?
Como um cão te acompanha a Fortuna encantada;
Semeia ao acaso a alegria e a desdita
E altiva segues sem jamais responder nada.
Calcando mortos vais, Beleza, a escarnecê-los;
Em teu escrínio o Horror é a jóia que cintila,
E o Crime, esse berloque que te aguça os zelos,
Sobre teu ventre em amorosa dança oscila.
A mariposa voa ao teu encontro, ó vela,
Freme, inflama-se e diz: “Ó clarão abençoado!”
O arfante namorado aos pés de sua bela
Recorda um moribundo ao túmulo abraçado.
Que venhas lá do céu ou do inferno, que importa,
Beleza! ó monstro ingênuo, gigantesco e horrendo!
Se teu olhar, teu riso, teus pés me abrem a porta
De um infinito que amo e que jamais desvendo?
De Satã ou de Deus, que importa? Anjo ou Sereia,
Que importa, se és quem fazes – fada de olhos suaves,
Ó rainha de luz, perfume e ritmo cheia! –
Mais humano o universo e as horas menos graves?
Baudelaire
3 comentários:
"Minha mina preciosa, meu império
feliz de quem penetre o teu mistério."
Baby, toda beleza e mistério que cabe em ti, encanta os meus olhos, o meu ser.
o nível das palavras que cabe aqui são de uma outra instância.
um beijo.
"Que venhas lá do céu ou do inferno, que importa,
Beleza!"
nada mesmo...mas não há como não ler nestes versos tanta solidão e desespero, entendo o poeta
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