20.3.10

Olhos Oblíquos

















Vens tu do céu profundo ou sais do precipício
Beleza? Teu olhar divino, mas daninho,
Confusamente verte o bem e o malefício,
E pode-se por isso comparar-te ao vinho.
Em teu olhar refletes toda a luz diuturna;
Lanças perfumes como a noite tempestuosa;
Teus beijos são um filtro e tua boca uma urna
Que torna o herói covarde e a criança corajosa.
Provéns do negro abismo ou da esfera infinita?
Como um cão te acompanha a Fortuna encantada;
Semeia ao acaso a alegria e a desdita
E altiva segues sem jamais responder nada.
Calcando mortos vais, Beleza, a escarnecê-los;
Em teu escrínio o Horror é a jóia que cintila,
E o Crime, esse berloque que te aguça os zelos,
Sobre teu ventre em amorosa dança oscila.
A mariposa voa ao teu encontro, ó vela,
Freme, inflama-se e diz: “Ó clarão abençoado!”
O arfante namorado aos pés de sua bela
Recorda um moribundo ao túmulo abraçado.
Que venhas lá do céu ou do inferno, que importa,
Beleza! ó monstro ingênuo, gigantesco e horrendo!
Se teu olhar, teu riso, teus pés me abrem a porta
De um infinito que amo e que jamais desvendo?
De Satã ou de Deus, que importa? Anjo ou Sereia,
Que importa, se és quem fazes – fada de olhos suaves,
Ó rainha de luz, perfume e ritmo cheia! –
Mais humano o universo e as horas menos graves?
  Baudelaire 

3 comentários:

Ribeiro Pedreira disse...

"Minha mina preciosa, meu império
feliz de quem penetre o teu mistério."

Baby, toda beleza e mistério que cabe em ti, encanta os meus olhos, o meu ser.

renata carneiro disse...

o nível das palavras que cabe aqui são de uma outra instância.


um beijo.

Non je ne regrette rien: Ediney Santana disse...

"Que venhas lá do céu ou do inferno, que importa,
Beleza!"
nada mesmo...mas não há como não ler nestes versos tanta solidão e desespero, entendo o poeta