3.3.13

Prelúdios-intensos para os desmemoriados do amor




Toma-me. A tua boca de linho sobre a minha boca 
Austera. Toma-me AGORA, ANTES 
Antes que a carnadura se desfaça em sangue, antes 
Da morte, amor, da minha morte, toma-me 
Crava a tua mão, respira meu sopro, deglute 
Em cadência minha escura agonia. 

Tempo do corpo este tempo, da fome 
Do de dentro. Corpo se conhecendo, lento, 
Um sol de diamante alimentando o ventre, 
O leite da tua carne, a minha 
Fugidia. 
E sobre nós este tempo futuro urdindo 
Urdindo a grande teia. Sobre nós a vida 
A vida se derramando. Cíclica. Escorrendo. 

Te descobres vivo sob um jogo novo. 
Te ordenas. E eu deliquescida: amor, amor, 
Antes do muro, antes da terra, devo 
Devo gritar a minha palavra, uma encantada
Ilharga 
Na cálida textura de um rochedo. Devo gritar 
Digo para mim mesma. Mas ao teu lado me estendo 
Imensa. De púrpura. De prata. De delicadeza.

II

Tateio. A fronte. O braço. O ombro. 
O fundo sortilégio da omoplata.
Matéria-menina a tua fronte e eu 
Madurez, ausência nos teus claros 
Guardados. 

Ai, ai de mim. Enquanto caminhas 
Em lúcida altivez, eu já sou o passado. 
Esta fronte que é minha, prodigiosa 
De núpcias e caminho 
É tão diversa da tua fronte descuidada. 

Tateio. E a um só tempo vivo 
E vou morrendo. Entre terra e água 
Meu existir anfíbio. Passeia 
Sobre mim, amor, e colhe o que me resta:
Noturno girassol. Rama secreta. 
(...)



[Júbilo memória noviciado da paixão (1974)]
[in Poesia: 1959-1979/ Hilda hilst. - São Paulo: Quíron; (Brasília): INL, 1980.]
 

Um comentário:

Ribeiro Pedreira disse...

descomentando. s/c!